segunda-feira, 7 de junho de 2010

Cartas

Martha Medeiros
Do livro Tudo o que eu queria te dizer

Nossa, quanta melancolia neste olhar. Você está perdendo as forças de tanto resistir a mim. E eu nem sou tão malvado assim, garota. Meu papel é apenas o de estimular sua liberdade, porque não é possível alguém ser escravo do bom comportamento o tempo todo. Pense bem: você tem mania irritante de atender a todos os telefonemas, todos. Não atenda. Deixe tocar de vez em quando, não interrompa o que estiver fazendo, mesmo que esteja deitada no sofá olhando pro teto. Não dê atenção ao chato que está chamando. E se você esquecer o aniversário da sua irmã, esqueceu, ora. Sem drama. Não caia no papo chantagista dela, todo mundo tem o direito de esquecer algumas datas, mande ela pentear macaco. E quando não estiver com vontade de dizer a verdade, minta. Quer trocar uma tarde de estudos por um banho de piscina, o que te impede? Quer sumir por uns dias? Deixe um recado “Sumirei por uns dias, tem carne congelada na geladeira” .
Agora enxugue essas lágrimas inúteis, levante este queixo e vá tratar da vida. Faça tudo o que deseja fazer. Você acha que depois de morta vai ganhar um bônus? Uma promoção pra tentar sair desse empate? Esqueça o empate. Vença. Perca. Ofereça a si mesma algum resultado.

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